Um dos papeis da arte é dar voz às questões sociais. Neste Agosto Dourado, é importante refletir sobre o fato de que apenas pouco mais de três em cada dez crianças amamentam exclusivamente no peito até os primeiros seis meses, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Alinhada com essa ideia, a musicista Camila Ribeiro apresenta o seu mais novo álbum Venter, uma produção que combina gêneros musicais, traz referências do Candomblé e arranjos propícios à reflexão sobre o Agosto Dourado, mês de defesa e promoção da amamentação. Na lenda do Candomblé, que fala do amor de Odé, deus da caça, e Oxum, Rainha das águas doces, que gerou Logun – Odé ancestral que vive seis meses nas águas, e seis meses nas matas, representa o equilíbrio dos elementos da natureza. Na natureza da mulher e do bebê, esse equilíbrio está no parto natural e humanizado e na amamentação. A quebra do ciclo desses elementos costuma trazer danos à saúde psicológica e física da mulher.

“A canção Ode a Odé tem inspiração na lenda de amor de Odé, deus da caça na mitologia africana, cujo fruto foi Logun – Edé, e Oxum, Rainha das águas doces. Esta história de amor reúne o equilíbrio dos elementos da natureza. Dialogando com o Agosto Dourado, essa lenda ensina que a natureza da mulher é de parir de forma normal e amamentar sua prole com o leite gerado pelo ciclo hormonal da gestação. Interromper o equilíbrio do curso natural do parto e da amamentação traz consequências ruins para a mulher, que, muitas vezes, adquire sequelas físicas e psicológicas; e para o bebê, que perde a imunidade e pode adquirir doenças ainda na fase de recém – nascido, ” explica a musicista Camila Ribeiro. 

Os singles Má, composto e interpretado em parceria com a cantora, compositora e instrumentista carioca Monique Kessous, e Brincando na Bahia, que marca a minha parceria com o músico Davi Moraes, “Pai da Guitarra rítmica no Brasil”, simbolizam a gestação de uma obra, que congrega diversas influências musicais e experiências rítmicas, tão natural quanto à vinda de um ser ao mundo e à amamentação. Venter nos brinda com outra música que remete a elementos fundamentais na relação mãe e bebê ao longo da amamentação.

Aspirante, um choro temperado com Maxixe, composto por Denny Kessous com a participação especial do violonista de 7 cordas Rogério Caetano, é um convite ao reencontro com o acalento, o cuidado, o ninar práticas saudáveis para a saúde física e psicológica da mãe e do bebê. A trilha pode acompanhar e inspirar mãe e filho na amamentação. Novamente o apelo à valorização e homenagem às raízes se faz presente em Ciranda Sobre o Tempo, uma homenagem às referências judaicas trazidas pelos imigrantes ao Brasil. Ajaí no Baque é um manifesto de resistência à música popular baiana, referendada nos bastidores por artistas do Axé Music. 

A vida e a arte de Camila Ribeiro

Ao longo de seis anos, Camila combinou, por meio do projeto Cordelândia, a literatura popular do cordel com a música folclórica. A inciativa, tocada em parceria com mais três colegas, durou seis anos.  Venceu, obtendo a maior nota do Brasil, o Prêmio Nacional Bolsa Funarte de Fomento aos Artistas e Produtores Negros/2015, assinando a co-criação e direção musical do espetáculo “Minha Pequena África”.

No ano de 2018, foi aprovada no mestrado acadêmico em Música da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), construindo uma referência no resgate da herança musical afro-indígena brasileira para a nova geração. A sua discografia começou em 2017 com o lançamento do seu primeiro disco solo, gravado no Rio de Janeiro, sob a produção do músico Denny Kessous. A obra marca a estreia da parceria da musicista, na faixa Brincando na Bahia, com o baiano Davi Moraes, um dos grandes nomes do Afropop no Brasil e referência para a carreira da multiartista. A composição traz letra de outro grande compositor soteropolitano, Gerônimo Santana, autor da canção ícone da música negra É D’Oxum. Em outro projeto ousado e criativo, Baile Frevo Roots, Camila une clássicos do repertório do frevo, composições de brasileiros que flertam com o ritmo e frevos autorais em uma simbiose com outras espécies musicais de várias partes do mundo.

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Edgard Homem

Por aqui transitam a arte e a cultura, o social – porque é imprescindível dar uma pinta de vez em quando, as viagens, a gastronomia e etc. e tal.

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